terça-feira, 16 de novembro de 2010

TRABALHOS UNIVERSITÁRIOS | michel foucault: a interdição da sexualidade

CENTRO UNIVERSITÁRIO CARIOCA - UNICARIOCA

Graduação em Comunicação Social
Oficina de leitura, interpretação e redação II
Professor: André Luiz Alves
Aluna: Luciana Costa Monteiro


A INTERDIÇÃO DA SEXUALIDADE
Baseado em Michel Foucault




"A sexualidade é polimorfa, polivalente, ultrapassa a necessidade fisiológica e tem a ver com a simbolização do desejo. Não se confunde com o instinto, nem com o objeto (parceiro), nem com o objetivo (união de órgãos sexuais no coito). Não se reduz aos órgãos genitais (ainda que esses possam ser privilegiados na idade adulta) porque qualquer região do corpo é suscetível de prazer sexual, desde que tenha sido investido de erotismo na vida de alguém e porque satisfação sexual pode ser alcançada sem a união genital. Nossa existência é sexuada e nossa sexualidade uma dimensão de autonomia” (CHAUÍ, 1991).



Interdição: proibição perpétua ou temporária de exercer certos atos.

Michel Foucault, em seu discurso na aula inaugural no Collège de France, em 1970, fala como a ordem do discurso acontece na sociedade ocidental desde os seus primórdios: de forma controlada, selecionada e redistribuída, de acordo com alguns procedimentos de exclusão que a minoria toma para o discurso da maior parte da população. E a mais conhecida forma de exclusão, é a interdição, ou a proibição de se falar e pensar em alguns assuntos que são tomados como tabus pela sociedade.

Dentro desses tabus, a sexualidade é o assunto onde mais sofremos interdições, onde mais existem palavras proibidas. “Mas, o que há, enfim, de tão perigoso no fato das pessoas falarem e de seus discursos proliferarem indefinidamente? Onde, afinal, está o perigo?”, pergunta Foucault (p.8, 2009). A interdição da linguagem, do discurso externo e interno, de tudo que concerne à sexualidade, começa a ser percebida por Foucault a partir de seus estudos antropológicos do século XVI até o XIX, quando a temática sexual passa a ser tratada pela medicina e psiquiatria (p.61, 2009).

A sexualidade, antes do século XIX, parecia não ter nenhuma dimensão social, era um assunto pessoal e particular. O poder da igreja católica romana regulava toda a conduta social, principalmente através dos discursos, que eram tidos, segundo Foucault, como “verdades produzidas”. Mas com a chegada da modernidade, o paradigma sexual sai dos discursos da igreja - que fica enfraquecida diante dos discursos da nova civilização, mais moderna e racional – e passa a ser falada através dos discursos da biologia e da medicina. Mas, falada, até certo ponto, porque a medicina da época havia sido tocada pela moral burguesa, dando justificativas científicas para a censura dos atos sexuais.

Apesar dos discursos terem mudado do religioso para o biológico-médico, nessa época ainda havia a interdição de qualquer análise que conduzisse à denúncia da relação existente entre a repressão sexual e as relações de poder. A repressão sexual passava a ser necessária para viabilizar o exercício do poder conforme as condições da nova ordem social burguesa. A sexualidade passou a constituir um problema, passou a ter uma conotação pejorativa, a ser vista como um ócio, um ato imoral quando praticado sem fins reprodutivos.

Segundo Foucault, a sexualidade é um “comutador que nenhum sistema moderno de poder pode dispensar. Ela não é aquilo que o poder tem medo, mas aquilo que se usa para seu exercício. As proibições não são formas essenciais do poder, são apenas seus limites, as formas frustradas. As relações de poder são, antes de tudo, produtivas.” (Foucault, 2000).

Na literatura, também durante o século XIX, a forma como a medicina passou a tratar o sexo serviu como pano de fundo para os romances como Madame Bovary, de Gustave Flaubert. E para os novos movimentos: o Realismo e o Naturalismo, contrários ao Romantismo, que trataram de pontos que incomodaram toda a sociedade burguesa ocidental. Livros como O Cortiço, de Aluísio Azevedo, Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis e O Ateneu, de Raul Pompéia, são escritos com discursos de verossimilhança, adotados pelo Realismo e Naturalismo, com assuntos como: as mazelas sociais e o sexo. Claro que tais autores sofreram interdições; e seus livros quando estudados nas escolas, até hoje, passam por recortes que mostram apenas as características que estão mais voltadas para o modo objetivo de escrever e o incômodo burguês da época, interditando as partes que tratam da sexualidade humana, proibindo, ainda que indiretamente, que se exponham uma das principais características destes movimentos artísticos.

A sexualidade humana não segue regras de cultura da sociedade vigente, mesmo quando esta tenta interditá-la. Mas como observamos em nossa sociedade atual, a interdição da sexualidade no discurso literário e no da medicina, sustenta desigualdades de gênero e de hierarquias sociais, tornando o assunto sexo, sensacionalista, físico e superficial. Que passa a ser explorado pelos meios de comunicação de massa, apenas para que estes veículos dêem lucro para os empresários. Aprendemos com Foucault que: “A partir do momento em que há uma relação de poder, há uma possibilidade de resistência. A sociedade pode modificar uma dominação sob determinadas condições e conforme uma estratégia adequada.”
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Bibliografia
CHAUÍ, Marilena de Souza. Repressão Sexual – Essa nossa (des)conhecida. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1991.


FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Ed. Graal, 2000.


FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo: Ed. Loyola, 2009.


LOURO, Guacira Lopes. O corpo educado: pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Ed. Autêntica, 1999.


STRATHERN, Paul. Foucault em 90 minutos. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar, 2000.

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